segunda-feira, 25 de julho de 2011

Disritmia

O desejo até podia ser o mesmo, mas o tempo não. A vontade de estar perto, de estar junto, de construir uma vida a dois era mútua. Mas ele queria agora, ela não. Ela queria o mundo. Queria voar, descobrir e se descobrir. E queria ele, depois disso. Ele tinha certeza e pressa. Principalmente pressa. Queria ela, casar com ela, filhos dela, envelhecer ao lado dela. Tudo agora. E, por um tempo, ela também queria. Ou achava que queria.
Decidiu partir. A cidade pequena a abafava, sufocava. Talvez pelo calor, talvez pelo tanto tempo sem nada. Precisa de desafios, obstáculos, objetivos. Precisava construir algo. E o deixou. Não por muito tempo, pensou. Mas não por pouco, também. Ele precisava aprender que o mundo ia além dela. Que era grande, enorme. Que era possível ser feliz, também, sem ela.
Mas ela o queria bem. Queria-o por perto. Mesmo que o perto ainda fosse longe. Ajudou que ele se encontrasse. Buscasse um rumo melhor, um caminho mais amplo. Acreditasse que, sim, ele também podia construir o seu mundo. E que, com seus mundos mais concretos, seus caminhos poderiam voltar a se cruzar. Porque havia o desejo mútuo de passarem uma vida juntos.
Mas ele tinha pressa. E certeza. E vontade de tudo agora. Mal começou a trilhar a nova estrada e substituiu ela. Fez novos planos e, sem planejar nada, casou, engravidou, envelheceu. Longe dela. Que aprendeu a voar, a descobrir o mundo. E se descobrir a cada dia.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Xará

- Seu nome é assim mesmo, como está no cartão?
- Oi?
- O seu nome. É Paula Fernandes mesmo?
- Ah, é sim - digo, enquanto meu irmão e uma amiga caem na gargalhada.
- Nossa, que legal, ter um nome assim, famoso!
- É... mas o nome é meu há mais tempo - completo.
Comecei a pensar. O que é que passa pela cabeça da moça? Que roubei o cartão da Paula Fernandes? Que sou tão fã que até mudei o meu nome para ser igual ao da ídola (ainda bem que eu não pensei nisso quando eu queria ser a Sandy). Que eu empresto o meu nome para ela e recebo cachês no final do mês? Paulinha, querida, chegaram algumas contas desse mês, quer que envie por e-mail ou te passo o valor e você deposita, bem?

terça-feira, 5 de julho de 2011

Ausência de fé

A gente era inocente, lembra? Eu via em você todo o futuro que eu planejava pra mim. Mas você sequer percebia que eu existia. Pelo menos era o que eu pensava. O que sempre tive certeza, já que as minhas amigas sempre tiveram muito mais a sua atenção do que eu.
Sempre acompanhei sua vida. À distância, como eu podia. Comemorei seu casamento, o nascimento da sua filha. Comemorei, sim, porque aquilo que eu sentia, outrora, transformou-se num carinho enorme. Uma vontade grande de te ver feliz, sempre.
As nossas vidas tomaram rumos desiguais, bem diferentes. Eu acredito na alma humana, na força do ser, mas tenho medo. Muito medo. Você tem uma certeza que jamais me pertenceu. Quando conversamos, sempre sinto uma vontade forte, muito forte, de chorar. Eu tenho medo, meu querido, do que escolhi. Mas tenho medo, também, do que posso escolher. Eu penso que esse mundo é grande demais e que eu preciso conhecê-lo. Acredito que o futuro que, agora, tenho em mente, não cabem nos planos que você acredita serem os melhores. E tenho medo de estar errada.
Eu agradeço, mesmo, a sua ajuda. A sua insistência. A sua vontade de me ver, como você diz, no caminho certo. E espero que você não se decepcione comigo. E que você saiba que o que eu senti, um dia, por você, está aqui. Bem guardado. E faz com que eu pense realmente em tudo isso.