Ela acordou com o sorriso no rosto, dando-lhe um beijo de bom dia. Era o seu dia e ela queria que ele se sentisse especial. Ao abrir os olhos, ele viu o sorriso e logo entendeu.
- Hoje não, amor. Hoje não.
Não, ele não gostava daquele dia. Para ele, o dia era de resguardo. Sigilo, prece, aquietação. Sua alma, presa, queria gritar. Queria que gritasse, que chorasse, para que, enfim, esquecesse. Mas ele preferia calar. Não gritava, não chorava e as memórias lhe martelavam a cabeça. Como esquecer de algo que o acompanhara por toda a vida?
Tudo aconteceu dois meses antes do seu nascimento. O pai, taxista, havia sumido. Ninguém sabia do seu paradeiro. A mãe esperou por longos dois meses. Ao pai e ao filho, que estava por vir. O filho chegou e, com ele, a alegria do nascimento de uma criança tão esperada. Mas o pai não estava ali para ver que era a sua cara. Para ajudá-lo nos primeiros passos, com sua primeira bicicleta e ensinar a conquistar a primeira namorada. Não, o pai havia sumido. Até aquele dia.
Enquanto o médico felicitava a mãe pela chegada do menino, um parente entra pela porta com ares de velório. Haviam encontrado o pai da criança. O corpo dele. Estava morto. Morreu porque alguém imaginou que sua vida valia menos que seu automóvel. Morreu, mas o carro não estava mais ali.
- Hoje não, amor. Hoje não. Você sabe, não gosto de comemorar meu aniversário. Amanhã, se você quiser, eu aceito os parabéns. Mas hoje não, por favor.
Sou péssima para datas de aniversário, mais ainda para os dias de tragédias, nunca lembro do dia exato que ocorreram e me perco até em meses.
ResponderExcluirNesse caso, com certeza, eu me lembraria. E acho até que comemoria, assim como ele, noutro dia.